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sábado

As árvores de Regina Casé


Divulgação
Por Carolina Cunha

Pode ser o ar que respiramos, sombra em dia de calor, uma fruta fresca, um abrigo para pássaros e até o nome de um país. Por vezes despercebidas, as árvores fazem parte da nossa vida e são verdadeiras testemunhas das transformações do mundo.

Quem fala com propriedade sobre o assunto é a apresentadora e atriz Regina Casé, uma apaixonada por esses seres verdinhos. Desde 2001, ela comanda o programa Um Pé de Quê?, exibido no canal Futura, que conta com direção e roteiro de seu marido, Estevão Ciavatta.

Na TV, a dupla viaja pelo planeta e mostra várias espécies de plantas e árvores nativas, retratando as origens, características botânicas e sua participação em momentos da cultura e da história da humanidade.

A experiência foi parar nos livros e inspirou a coleção Um Pé de Quê?, editada pela WMF Martins Fontes. Voltada para o público infantojuvenil, a série busca aproximar as pessoas de árvores brasileiras, com títulos como Pau-BrasilSeringueira, Umbu Favela, nomes de importantes espécies que fazem parte da formação do país. Até o final do ano, mais três volumes podem ser lançados.

O SaraivaConteúdo conversou com Regina Casé sobre as publicações e sua relação de afeto com as árvores. E ela ainda revelou qual é o seu pé favorito. Veja a entrevista.
 
Como surgiu a ideia da coleção?
 
Regina. A gente sempre quis fazer um livro do Um Pé de Quê?, e eu acho que esse também é um projeto que ainda está para vir. A gente brinca que seria um Aurélio, um grande dicionário de plantas, sem ser absolutamente técnico, para botânicos ou agrônomos, mas para qualquer pessoa. Um Aurélio que tanto uma pessoa de 80 anos quanto uma de oito pode consultar. No meio desse plano, a Martins Fontes sugeriu que também poderia ser um livro. Eu adoro coisas que não são para uma faixa etária especifica. Isso que eu achei legal, porque é um livro usado em escola, infantojuvenil, mas que todos os adultos que leram até hoje adoraram. A ideia de ter também muita ilustração – a obra não chega a ser de quadrinhos, mas é toda ilustrada – nos deixou mais animados ainda, porque seria uma maneira de aproximar ainda mais as pessoas das árvores e da botânica.
 
Qual a sua relação com as árvores?
 
Regina. Eu gosto de planta, digo isso sempre, mas o meu negócio mesmo é árvore. Eu sempre fiquei encantada com o tamanho das árvores. A árvore é uma coisa que, mesmo quando você cresce, faz você se sentir criança. Você fica pequenininho perto dela. É como se você estivesse vendo um brócolis gigante, uma couve-flor gigante, uma rosa gigante... Eu, por exemplo, sempre gostei de olhar as raízes. Tenho lembranças muito remotas de infância, quando andava da minha casa para o colégio, naquela época em que as figueiras estão soltando as frutinhas, aí você vai pisando nas sementinhas e elas fazem um barulho gostoso. Ou da época em que as amendoeiras mudam de folhas e o chão inteiro ficava cheio de folhas vermelhas e amarelas... Então, eu tenho muitas lembranças de como as árvores iam decorando e mudando meu caminho. Sempre fui fascinada por árvores, mas aumentou a vontade de fazer o Um Pé de Quê? quando eu tive a Benedita, minha filha. Porque ela me perguntava um monte de coisas que eu não sabia, aí comecei a correr atrás do prejuízo e a estudar para poder dizer para ela.
 
Tem alguma espécie de que você mais gosta?
 
Regina. Eu achava impossível responder a essa pergunta, mas já me questionaram isso tantas vezes por causa de Um Pé de Quê?, que eu resolvi eleger uma. Das palmeiras, a minha favorita é o Buriti; sou apaixonada pela folha, pelo fruto, pela imponência, e acho que não só eu, porque ela inspirou muita gente. Dentre os mais notáveis, o escritor Guimarães Rosa. Qualquer livro do Rosa que você leia, ele cita de alguma maneira um Buriti. E das árvores que não são palmeiras, a Sapucaia. Eu demorei a escolher, mas depois, pensei: “Puxa, de todas, realmente esta é a árvore com que fico mais empolgada". Porque as folhas, quando nascem (as folhas novas), são todas cor de rosa... Não são as flores, mas as folhas, cor de rosa, pink. E as flores são brancas e roxas. Lindo! E as sementes, frutos, as castanhas envoltas naquela “cumbuquinha” com uma tampa que parece que foi um artesão que fez. Eu acho que é a árvore mais legal que existe, disparado!
 
Cada árvore tem uma história para contar que o público não imagina. Durante o programa e nas suas viagens, existe alguma história que te surpreendeu?
 
Regina. Inúmeras. Durante algum tempo, usei óleo de andiroba, que é um poderoso anti-inflamatório, assim como a copaíba, que tem várias outras aplicações. E eu usava aquilo ali sem nem pensar de onde vinha. Quando a gente foi fazer o programa sobre a andiroba na Ilha de Marajó, no Pará, eu viajei um tempão de barco para chegar numa região onde tinha uma cooperativa de senhoras que não falam “coletar”, mas “pescar” andiroba, porque as sementes vão caindo no rio. Então, elas entram na água com uma peneira, fazendo uma operação que parece um garimpo misturado a uma pesca. Elas levam aquelas sementes para um lugar muito longe, onde são espremidas e vão caindo pingo por pingo num algodãozinho que vai para uma canaleta, que encaminha para um vidrinho. Muita gente trabalhando, com muito rigor e um monte de preceitos: não pode estar menstruada, a lua não pode estar “assim”, o clima não pode estar “assado”. Para resultar num vidrinho que a gente compra numa loja aqui e não tem respeito por ele. Eu, agora, se usar uma gota de óleo de andiroba ou de copaíba, sempre terei muito respeito pelo óleo que estou usando.
 
Por que é importante que o povo brasileiro e, principalmente, as crianças conheçam as árvores do país?
 
Regina. Acho que tudo o que a gente consome, as coisas com as quais a gente lida no dia a dia, a mesa em que a gente come, a cama em que a gente dorme, o carvão com que a gente faz churrasco... Parece que aquilo tudo caiu do céu ou que não veio de lugar nenhum... Quanto mais a gente sabe de onde veio, conhece pelo nome, fica “amigo”, mais cuidado vai ter ao consumir, ao usar, ao destruir. Um dos lemas de Um Pé de Quê? é que galinha que tem nome, de quem a gente fica "amigo", não vai para panela. Com árvore é a mesma coisa.